"Impulsionado pelo fascínio do ouro, pelos aventureiros que chegavam, pelos garimpos promissores, Desemboque cresceu rapidamente. Suas ruas logo se enchiam de casas, o comércio firmava-se, um torvelinho de gente de toda espécie arribava vertiginosamente no arraial, atraídos pela faina da riqueza fácil e pelo fascínio de conquistar uma terra ainda selvagem e inexplorada."
A beleza da paisagem e o clima de isolamento profundo que se respira em Desemboque, lugar onde a paisagem e a solidão são tão valiosas quanto a própria terra, descritos em uma crônica magistral de Mauro Santayanna:
ALQUEIRES DE BELEZA
"Os amigos, sábios e bem realizados fazendeiros de Uberaba, exigiram-lhe prudência:
-Cuidado ao comprar terras. Terra ruim não tem conserto. Além de não ganhar, você vai perder dinheiro.
E Ronaldo Cunha Campos, filho e neto de fazendeiros, família desbravadora de sertões, saiu à procura de terras. Afinal, advogado de grande prestígio, homem de inquieta e sólida cultura, sentiu, com os quarenta, a necessidade do retorno à terra. Havia referência geográfica que o chamava: as encostas da Serra da Canastra, onde seus avós se fixaram, na dura opção do desbravamento. Todos tentaram demovê-lo:
-Alí só dá capim barba-de-bode.
Glebas melhores lhe foram oferecidas. Massapê do bom, a preço razoável. Ronaldo ia, cavalgava furnas e fundos, cheirava a terra, para fazer-de-conta que entendia:
- É, não é ruim.
Mas, no domingo seguinte, voltava ao arraial do Desemboque, olhava as lápides do cemitério com nomes familiares, bebia a água dos regos abertos pelos bandeirantes:
-Não há fazenda para vender por aqui?
Os sábios matutos diziam que não, valorizavam o solo:
-Terrinha boa, doutor, ninguém quer vender não. Aqui não dá berne, nem desarranjo nas crianças.
Os meses passavam, as áreas boas inchavam em preço, os conselhos eram veementes:
-Compra a Fazenda da Baixada, Ronaldo. Pertinho, terra preta.
Ronaldo assentia, combinava encontro com os vendedores. Ao examinar os títulos de propriedade, objetava:
-Essa escritura não me parece boa.
Bom advogado, encontrava ilícitos onde tudo indicava lisura.
-É, não gostei dessa referência aqui. Pode dar complicações no futuro.
Até que encontrou fazenda para comprar no Desemboque. A mil e cem metros de altitude, com o vale do rio à frente e, além, o aberto Chapadão do Bugre.
E quando lhe disseram que a terra nada valia, perguntou:
-E quanto vale o alqueire de paisagem?”